Relações que pedem ao outro o que é da própria agência. Sinais clínicos e caminhos de tratamento.
Há relações em que o outro parece ocupar uma função vital. É como se o humor, o senso de segurança e até a autoestima dependessem do que o outro faz, diz ou demonstra. Quando isso acontece, não estamos mais falando apenas de amor, e sim de regulação emocional terceirizada.
Em psicologia, chamamos de dependência afetiva essa dinâmica em que a pessoa precisa constantemente da confirmação externa para sentir-se estável. Ela se adapta, silencia incômodos, tenta agradar. E, ao mesmo tempo, cobra, vigia e desconfia. A presença do outro vira anestésico; a ausência, abstinência.
Isso não tem a ver com “carência” no sentido superficial. Tem a ver com história de vinculação. Em algum momento, essa forma de se relacionar foi uma tentativa legítima de garantir pertencimento. Aprender a ler o outro, a agradar, a evitar rejeição foi uma estratégia de sobrevivência. O problema é quando esse modo de funcionar continua operando na vida adulta, em contextos que já não exigem tanta adaptação.
O que antes foi proteção passa a ser prisão.
É comum, nesse padrão, que a pessoa viva oscilando entre fusões intensas e rupturas abruptas. Nos momentos bons, sente-se completa; nos maus, sente-se inexistente. O outro deixa de ser alguém e se torna um espelho: se ele aprova, eu existo; se se afasta, eu desapareço.
Essa instabilidade costuma vir acompanhada de culpa: “sei que estou sendo irracional, mas não consigo controlar”, e de vergonha, “deveria ser mais independente”. O resultado é uma mistura de dependência e autodepreciação.
Na clínica, o trabalho é devolver o eixo.
Não se trata de “aprender a ser sozinho”, mas de reaprender a sustentar a própria presença, mesmo diante da ausência do outro. Isso implica reconstruir fronteiras, revisar crenças sobre o amor, e, sobretudo, reconhecer o medo que sustenta o apego. O medo de perder o vínculo, de não ser escolhido, de não ser suficiente.
Com o tempo, esse medo vai sendo nomeado, olhado, escutado até que possa deixar de comandar. É um processo lento, mas possível.
A autonomia emocional não nasce da distância, mas da capacidade de estar em vínculo sem desaparecer dentro dele.
O amor não deveria ser um lugar de refúgio contra o vazio.
Deveria ser um espaço em que dois sujeitos inteiros se encontram, não para se completar, mas para se acompanhar.